A modéstia levava-o a (des)considerar as crónicas como uma servidão
diária que afirmava com humor só aceitar para alimentar a legião de
gatos que tinha em casa e que só serviriam, como tudo o que é jornal e
como diziam os velhos tipógrafos do JN num dito que ele tantas
vezes citava, para embrulhar peixe no dia seguinte. Ou seja, as
crónicas, até pelo seu registo diarístico (jornalístico), não possuiriam
nenhum valor literário, seriam feitas como tudo o mais mas mais do que
tudo «da matéria da morte e do esquecimento», anacrónicas fora da sua
efémera duração, e como tal constituiriam uma dimensão menor,
extraliterária, da sua obra. E no entanto, pelas suas características,
essas crónicas fazem plenamente parte, de pleno direito, da obra
literária de Manuel António Pina. Se ele definia a sua poesia, por
complexas razões de poética que não cabe aqui explicar, como «saudade da
prosa», as suas crónicas jornalísticas podem definir-se, de certo modo
determinante da sua popularidade, como saudade da literatura.
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Ficha Técnica